2009/04/14

A Civilização Industrial

INAUGURAÇÃO DO COMBOIO
"Finalmente, avistámos ao longe um fumozito branco, na frente de uma fita escura que lembrava uma serpente a avançar devagarinho.

Era o comboio!

Quando se aproximou, vimos que trazia menos carruagens do que supúnhamos.

Vinha festivamente embandeirado o wagon em que viajava EI-Rei D. Pedro V.

O comboio parou um momento na estação, de onde se ergueram girândolas estrondosas de foguetes; vimos EI-Rei debruçar-se um instante e fazer-nos uma cortesia; meu pai, alegremente, acenou-nos um adeus rápido. Tudo passou como uma visão (...).

Só no dia seguinte ouvimos meu pai contar, com aquela "verve", que lhe era peculiar em certas ocasiões, as várias peripécias dessa jornada de inauguração.

A máquina, escusado será dizer, das mais primitivas (parecia um enorme garrafão), não tinha força para puxar todas as carruagens que lhe atrelaram; e foram-as largando pelo caminho. Algumas, de convidados, nos Olivais. O vagão do Cardeal-Patriarca e do Cabido ficou em Sacavém; mais um, recheado de dignitários, ficou ao desamparo na Póvoa. Creio que se o Carregado fosse mais longe, e a manter-se uma tal proporção, chegava lá a máquina sozinha ou parte dela."

Fonte: Memórias da Marquesa de Rio Maior.


COMBOIOS PRINCEPESCOS

«O caminho-de-ferro revolucionou as vias de comunicação terrestre em meados do século XIX. O comboio, para além, de constituir um importante meio de transporte de mercadorias, também foi um importante símbolo de status para as classes abastadas, como é o caso dos milionários americanos. Estes possuíam carruagens extremamente luxuosas, com mármores nas casa de banho, torneiras de ouro e ornamentos de valores incalculáveis. Vários monarcas mandavam decorar as suas carruagens com revestimentos de extremo requinte: o rei Luís da Baviera mandou acolchoar os assentos das sanitas com penas de cisne e ordenou a circulação do seu comboio vazio, por todo o reino, para que o admirassem; a carruagem onde a rainha Vitória fez a sua primeira viagem, tinha reposteiros de seda branca e carmesim e sofás principescamente estofados; a do Papa Pio IX tinha uma sala de trono forrada de veludo branco.»

Resumo e adaptado de Sabia que ....?.




UMA VIAGEM DE COMBOIO

"Espera-se que a via Larmanjat, inaugurada há poucas semanas, transforme Sintra em um daqueles confluentes de patuscadas onde passem um dia regalados os lisboetas que não têm tempo nem cabedal para se andarem à cata de felicidades um pouco mais longe de casa. A experiência porém que tenho do Larmanjat autoriza-me a dizer que tão-somente uns para quem economizar uma hora a um ou dois mil réis é negócio importantíssimo, poderão jornadear segunda vez por tal transporte. Construíram-no segundo um sistema que em França foi experimentado, ouvi dizer, com insignificante êxito e diminuta protecção. Disseram-me uns engenheiros que a invenção se malograria afinal porque, sendo o rail de madeira, assim que chove, o pau pega de inchar e descarrila o veículo. Está quase concluída outra via para Torres Vedras pelo mesmo sistema. As carruagens são de duas classes, primeira e terceira; a segunda virá depois. Compõe-se a primeira de dois bancos centrais, costas com costas, separados por uma divisão que sobe quase até ao tejadilho da carruagem. Tem duas portinholas de entrada de cada lado e um postigo com vidraça e cortina defronte de cada passageiro. Quanto à terceira, essa não é dividida nem envidraçada: tem uma grosseira cortina, em vez de janela. Empregam uma escova na remoção do lixo e cascalho ou outros empecilhos ao trânsito. A velocidade é moderada; andam dezasseis milhas em duas horas e um quarto. Entendemos logo que levar as janelas fechadas era morrermos abafados; porém, como neste tempo se alastra uma camada de pó de altura pelo menos de um pé nas margens da estrada, assim que abrimos a janela invadiu-nos a poeira que literalmente nos cobriu desde a cabeça até aos pés. Descemos a cortina, que era de uma franzina gaze, e não melhorámos de situação. Encheram-se-nos as bocas e os olhos daquele saibro irritante, que nos atacava às ondas com a picante impressão de vidro moído. Toda a gente parecia levar cabeleira polvilhada ou ter encanecido à última hora. Tapávamos a cara com os lenços para evitar a cegueira ou a asfixia - o que provavelmente aconteceria sem tais resguardos.

E então os solavancos!

Nunca os esquecerei... tão desapiedadamente lá fui manteada! Às vezes íamos sacudidos de encontro ao tecto; e então não só aconchegávamos reciprocamente os joelhos por causa da estreiteza do veículo, mas até os fincávamos uns contra os outros, preferindo isto a sairmos cheios decontusões negras e azuladas da pancadaria que levássemos de encontro às ilhargas do carro. E, no entanto, a máquina ia trapeando, arfando, silvando e rugindo como eu nunca tinha ouvido máquina nenhuma. Demais a mais, uma grande sineta ia num perpétuo repicar avisando os viandantes e os boleeiros dos trens que se desviassem do caminho do «grande Larmanjat»."

Fonte: JACKSON, Lady . A Formosa Lusitânia

1 comentário:

Anónimo disse...

O carro foi uma forma de transporte muito interessante e inovadora para a altura!
Através do filme apercebi-me que o que para nos hoje é uma coisa banal na altura era um motivo de festa. Andar de carro!

teresa moreira